Dormir bem é essencial para a saúde de homens e mulheres. Entretanto, nas últimas décadas, pesquisas têm destacado diferenças intrigantes entre os gêneros em vários aspectos do sono. Diferenças que, muito provavelmente, contribuem para as disparidades na prevalência de distúrbios do sono e comorbidades entre os sexos.1
Embora os mecanismos subjacentes a essas diferenças ainda não sejam totalmente compreendidos, algumas explicações já foram propostas. Uma delas diz respeito aos efeitos organizacionais dos hormônios sexuais, que desempenham um papel vital na regulação do sono.1; 2
Outra possível explicação envolve as diferenças na sincronização temporal do organismo. As mulheres tendem a ter períodos circadianos mais curtos do que os homens, o que as torna mais propensas a sofrer distúrbios relacionados ao ritmo circadiano.2 Além disso, ainda que influenciadas por fatores ambientais e psicossociais, essas disparidades de gênero também parecem depender do complemento cromossômico sexual (XX ou XY).1
Quando analisamos quantidade e qualidade do sono, estudos mostram que as mulheres tendem a dormir um pouco mais, demoram mais para adormecer e relatam pior qualidade do sono, especialmente maior fragmentação, em comparação aos homens (Tabela 1).3; 4; 5; 6
Gênero |
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Homens |
Mulheres |
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Duração total do sono (objetiva) |
Dormem menos, apresentam maior declínio do sono NREM com a idade |
Dormem aproximadamente de 6 a 28 minutos a mais por noite, tendem a apresentar mais sono REM |
Latência para dormir |
Latência menor em todas as idades |
Maior latência (demoram mais para adormecer), especialmente após os 40 anos |
Qualidade subjetiva do sono (PSQI) |
Melhor percepção subjetiva do sono e menos queixas de insônia |
Relatam pior qualidade de sono: mais despertares, sono não restaurador |
Paradoxo duração × qualidade |
Dormem menos, mas percebem seu sono como mais satisfatório |
Apesar de dormirem mais objetivamente, relatam sono mais fragmentado e de pior qualidade subjetiva |
Pesquisas sobre características fisiológicas e clínicas do sono também apontam que o declínio da qualidade do sono nas mulheres é mais acentuado durante a transição menopausal. Elas tendem a ter um cronotipo mais matutino do que os homens, e suas oscilações hormonais impactam muito mais no sono do que o declínio hormonal observado nos homens. É interessante notar que os homens apresentam mais frequentemente ronco crônico, enquanto as mulheres são mais propensas à insônia, síndrome das pernas inquietas e fragmentação do sono na menopausa (Tabela 2).2; 7
Gênero |
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Homens |
Mulheres |
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Sono com o envelhecimento |
A deterioração do sono é mais lenta e gradual com a idade |
O declínio da qualidade do sono é mais acentuado antes dos 60 anos, especialmente na transição menopausal |
Cronotipo e ritmo circadiano |
Tendência ao cronotipo vespertino, com maior atraso de fase após os 40 anos |
Tendem a ter cronotipo mais matutino e período circadiano mais curto |
Influência hormonal |
Testosterona tem influência mais estável e discreta no sono do homem |
Oscilações de estrogênio e progesterona impactam fortemente o sono (tensão pré-menstrual, gravidez, menopausa) |
Distúrbios prevalentes |
Maior prevalência de apneia obstrutiva do sono (AOS) e ronco crônico |
Maior risco de insônia, síndrome das pernas inquietas, fragmentação do sono na menopausa |
Do ponto de vista dos endótipos, os homens apresentam maior instabilidade ventilatória, mais fragilidade na sustentação da via aérea durante o sono e um sono globalmente mais sustentado em comparação com as mulheres (Tabela 3).8
Gênero |
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Homens |
Mulheres |
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Loop gain |
Maior instabilidade ventilatória |
Melhor estabilidade respiratória |
Colapsabilidade da via aérea |
Pior estabilidade das vias aéreas, com maior probabilidade de ocorrência de eventos respiratórios completos (apneias) |
Melhor estabilidade das vias aéreas, com maior probabilidade de ocorrência de eventos respiratórios parciais, como hipopneias e micro despertares. |
Limiar de despertar |
Mais alto, acordam menos com os eventos respiratórios |
Mais baixo, com maior probabilidade de acordar frente a estímulos leves |
Mas quais são as potenciais implicações clínicas dessas diferenças de gênero na fisiologia e nos distúrbios do sono? Sobretudo, elas abrem espaço para uma abordagem terapêutica diferenciada entre homens e mulheres. E há diversos estudos já disponíveis sobre o tema.
Diferenças na farmacocinética entre os sexos, por exemplo, são bem documentadas em várias terapias. Um exemplo clássico é o zolpidem, um hipnótico não benzodiazepínico amplamente utilizado para melhorar a qualidade do sono em pacientes com insônia. Estudos mostram que mulheres podem precisar de doses significativamente menores do que homens para evitar efeitos colaterais, como sonolência residual, que aumenta o risco de acidentes ao dirigir ou em outras atividades que exigem atenção.6
Outro estudo interessante, com 79 homens e 79 mulheres submetidos a tratamento bariátrico para perda de peso, demonstrou que essa intervenção foi mais bem-sucedida para mulheres com AOS. Apesar de não haver diferenças significativas na porcentagem média de perda de IMC entre os sexos, uma proporção maior de mulheres (90%) conseguiu descontinuar o uso de CPAP em comparação aos homens (77,5%). Essa diferença pode estar relacionada à distribuição diferenciada da gordura corporal entre os sexos.6; 9
Além disso, um ensaio clínico randomizado recente mostrou que as mulheres apresentam maior supressão de melatonina do que os homens quando expostas à mesma intensidade luminosa. Por exemplo: a 400 lux, a supressão foi de 93,7 ± 9,6% nas mulheres, contra 83,2 ± 18,7% nos homens; a 2000 lux, 99,5 ± 1,0% nas mulheres versus 96,9 ± 4,3% nos homens.10
Também já se acumularam evidências observacionais que associam o horário da atividade física à saúde cardiovascular. Como homens e mulheres apresentam diferenças marcantes na fisiologia do exercício e no cronotipo, é possível que o impacto do horário de exercícios e da alimentação sobre os ritmos biológicos seja diferente entre os sexos. Isso reforça a necessidade de considerar essas diferenças em pesquisas futuras para maximizar os benefícios das intervenções.6
Em última análise, o tratamento dos distúrbios do sono com base em dados que correlacionem ciclos de sono e secreção hormonal em cada sexo pode levar a uma compreensão mais profunda das condições do sono e ao aprimoramento das estratégias terapêuticas.2
Por isso, é fundamental que os profissionais de saúde estejam sempre atualizados sobre as pesquisas focadas nas diferenças de gênero e suas implicações fisiológicas nos distúrbios do sono. Compreender essas diferenças permite que sejam oferecidas intervenções mais personalizadas e eficazes para o manejo do sono em homens e mulheres.2
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